A história é sempre a mesma: empresas
denunciadas por corrupção com os governos federal, estaduais e municipais
rapidamente descaracterizam o envolvimento e responsabilizam apenas
funcionários pelos atos irregulares. Para mudar a situação tramita desde 2010
na Câmara dos Deputados, o Projeto de Lei 6.826, que dispõe sobre a
responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas pela prática de
atos contra a administração pública, nacional ou estrangeira. O texto torna
possível punir empresas em casos como o da Delta Construções S.A.
O objetivo da lei é reprimir não
apenas os corruptos, mas também os corruptores. Para Jorge Hage, ministro-chefe
da Contralodoria-Geral da União (CGU), é necessária punição mais árdua para as
empresas corruptoras. “Hoje, a única penalidade que a administração pública
pode aplicar é a declaração de inidoneidade, que impede empresas de participar
de novos contratos ou licitações. Isso é muito pouco”, explica.
“É preciso legislação adequada para
permitir que alcancemos o patrimônio da empresa e responsabilizar a pessoa
jurídica, para facilitar a recuperação do dinheiro público”, afirmou Hage em
entrevista ao programa Bom Dia Ministro, do último dia 29 de março.
Segundo a assessoria do relator do
projeto de Lei, deputado Carlos Zarattini, a previsão é que na próxima reunião
da Comissão Especial que analisa o texto, a votação do projeto entre na pauta.
Se aprovada, a nova lei prevê formas de punição, com multas de até 20% do
faturamento bruto da empresa, declaração de inidoneidade por até cinco anos e a
suspensão do funcionamento da empresa e algumas outras penas aplicáveis pelo
próprio Poder Executivo.
Para o cientista político e professor
da Universidade de Brasília, David Fleischer, a pessoa jurídica tem que ter
punição. “As empresas afastam os gestores responsáveis da própria imagem e
administração e ficam sem a devida punição. Foi o que aconteceu com as empresas
que fraudaram licitações no Hospital Universitário do Rio e o que fez a Delta
Construções essa semana”, explica.
Para o professor, a falta de punição
para pessoa jurídica, assim como para com a pessoa física, é nociva ao povo
brasileiro. Porém, a partir do momento que conseguirmos punir não só os
corruptos, mas também corruptores, será possível abranger a legislação para o
combate à corrupção.
“É sempre muito difícil provar quem
deu a ordem para que o preposto suborne o servidor. A nova lei afastará a
necessidade dessa prova, bastando demonstrar que a empresa se beneficiaria do
esquema”, afirma Hage. “Mas, para que esses processos não se arrastem por anos
a fio, será preciso que se alterem as leis processuais e se aprove também a PEC
número 15, que retira o efeito suspensivo dos recursos excepcionais ao STJ e ao
STF”, completa.
Neste sentido, apesar de acreditar em
mudanças que trariam benefícios ao Código Penal, Fleischer é pessimista em
relação à eficácia da Lei. “Podem mudar a legislação, mas se o Judiciário não
funcionar, de nada adiantará. As pessoas nunca viram ninguém ir parar na prisão
ou o dinheiro roubado voltar aos cofres públicos”, conclui.
Conheça mais sobre o Projeto de Lei
A aprovação do Projeto de Lei 6.826,
de 2010, vai dar efetividade a três tratados internacionais antissuborno e
anticorrupção ratificados pelo Brasil (convenções da Organização das Nações
Unidas – ONU, da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico –
OCDE, e da Organização dos Estados Americanos – OEA).
Além disso, o texto supre importante
lacuna na legislação brasileira no combate à concorrência desleal e
fraudulenta. Apesar de já existirem a Lei de Licitações (8.666/1993) e a Lei
Antitruste (8.884/1994) com o propósito de combater condutas lesivas ao
patrimônio público e disputas comerciais desleais, a nova legislação é que,
realmente, irá possibilitar a punição efetiva do corruptor, a empresa jurídica
que, diuturnamente, corrompe servidores inescrupulosos.
A lei de responsabilização da pessoa
jurídica tem por finalidade proteger, entre outros, os princípios constitucionais
de liberdade de iniciativa, da livre concorrência, da função social da
propriedade, da defesa dos consumidores e dos contribuintes a partir de regras
de prevenção e de repressão à concorrência desleal, à infração ou abuso de
poder econômico que atentem contra as estruturas de mercado.
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