Trata-se de AÇÃO CIVIL PÚBICA por improbidade administrativa proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO AMAPÁ contra MOISÉS REÁTEGUI DE SOUZA e outros, na qual pretende o autor ver decretada, liminarmente, a indisponibilidade dos bens dos réus até o valor de R$ 5.476.650,43 (cinco milhões, quatrocentos e setenta e seis mil, seiscentos e cinquenta reais e quarenta e três centavos), referente ao suposto dano causado ao patrimônio público.
Alegou o MPE que os eventos tratados nesta ação ocorreram no âmbito da Assembleia Legislativa do Estado do Amapá, restando provado que não houve a contraprestação dos serviços de locação de veículos e que a contratação não passou de simulação com o fim de permitir a apropriação de dinheiro público.
Ressaltou que a investigação promovida revelou que a Assembleia Legislativa firmou com a COOTRAM, no dia 3/3/2012, o Contrato nº 011/2011-AL/AP, no valor de R$ 3.368.350,00 (três milhões, trezentos e sessenta e oito mil, trezentos e cinquenta reais), com vigência até o dia 30/8/2011. Posteriormente, tal contrato foi objeto de um primeiro termo aditivo, firmado em 31/8/2011, aumentando o valor da contratação para R$ 4.654.500,00 (quatro milhões, seiscentos e cinquenta e quatro mil e quinhentos reais).
Relatou que teve acesso às cópias dos cheques emitidos pela Assembleia Legislativa do Estado do Amapá à Cooperativa de Transporte de Veículos Leves e Pesados do Amapá - COOTRAM, relativos ao contrato nº 011/2011-AL/AP, que totalizaram a estrondosa quantia de R$ 5.476.650,43 (cinco milhões, quatrocentos e setenta e seis mil, seiscentos e cinquenta reais e quarenta e três centavos) [fl. 9].
Salientou que através de informações encaminhadas pelo Banco do Brasil, ficou provado que ao invés dos cheques serem pagos à COOTRAM, foram sacados, muitos deles, diretamente na boca do caixa, pelo requerido Gleidson Luís Amanajás da Silva.
Ao final, afirmou que restou evidenciada a fraude na dispensa de licitação de que trata o processo administrativo nº 029/2011-PRESI/AL, assim como a simulação a contratação da referida Cooperativa, sob o argumento de urgência para atender uma situação de necessidade que inexistia e não restou comprovada na espécie, pois a empreitada teve por finalidade unicamente proporcionar o desvio do dinheiro da referida contratação, que alcançou a impressionante quantia de R$ 5.476.650,43 (cinco milhões, quatrocentos e setenta e seis mil, seiscentos e cinquenta reais e quarenta e três centavos), com a participação efetiva de todos os demandados.
Assim, pugnou pela concessão de medida liminar para o fim de: a) decretar a indisponibilidade dos bens dos requeridos, até o limite de R$ 5.476.650,43 (cinco milhões, quatrocentos e setenta e seis mil, seiscentos e cinquenta reais e quarenta e três centavos); b) determinar o bloqueio de valores depositados em contas bancárias [via Bacenjud] e em planos de previdência privada complementar de titularidade dos requeridos; e c) expedição de ofícios ao Detran/AP e Cartórios de Registro de Imóveis, para as devidas anotações de indisponibilidade dos bens eventualmente registrados em nome dos réus.
DECIDO.
No caso concreto, depois de examinar atentamente a documentação acostada aos autos, reputo presentes fortes indícios de improbidade administrativa, a justificar a decretação de indisponibilidade de bens dos requeridos.
Frise-se que não cabe, nesta fase processual, grande incursão na análise do conjunto probatório, até porque não foi inaugurado o contraditório.
Nessa perspectiva, destaco que o Ministério Público do Estado do Amapá, com respaldo nos autos do Processo Administrativo nº 029/2011-PRESI/AL, bem como através de informações bancárias e testemunhais, logrou êxito em demonstrar a presença de fortes indícios de atos de improbidades administrativas no curso da contratação da Cooperativa de Transportes de Veículos Leves e Pesados do Amapá - COOTRAM, pela Assembleia Legislativa do Estado, para a prestação de serviços de locação de automóveis.
De fato, restou evidenciado que a contratação da referida Cooperativa pela Assembleia Legislativa deu-se em caráter supostamente emergencial para viger até 30/8/2011 e de acordo com a Lei 8.666/93, em seu art. 24, inciso IV, prescreve que tais contratações são temporárias e não podem ser prorrogadas.
Ainda assim, constata-se que o Contrato nº 011/2011-AL/AP foi objeto de termo aditivo, prorrogando a vigência do contrato até 31/12/2011, aumentando o valor da contratação de R$ 3.368.350,00 (três milhões, trezentos e sessenta e oito mil, trezentos e cinquenta reais) para R$ 4.654.500,00 (quatro milhões, seiscentos e cinquenta e quatro mil e quinhentos reais).
O MP assentou que a prova carreada para os autos ganhou ainda mais substância com as oitivas do requerido Sinésio Leal da Silva, Presidente da COOTRAM, que espontaneamente revelou o esquema de fraude à licitação com o direcionamento da contratação e o pagamento pela ALEAP por serviços não prestados.
Não bastasse isso, de acordo com o requerido Antônio Bazílio Lima da Cunha, integrante [à época] do Conselho Fiscal da COOTRAM, o esquema consistiria em emitir as notas fiscais, sem a contrapartida do serviço (de aluguel de carros) e JÚNIOR iria dar um percentual para o depoente e para SINÉSIO.
Tais fatos corroboram, suficientemente, para a constatação da existência de improbidade administrativa praticada pelos demandados, consubstanciada na fraude em licitação.
Noutro giro, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça reconhece a desnecessidade de prova de periculum in mora concreto, ou seja, de que os réus estariam dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo para permitir a indisponibilidade de bens. Confira-se:
(...) 2. A indisponibilidade dos bens é medida de cautela que visa a assegurar a indenização aos cofres públicos, sendo necessária, para respaldá-la, a existência de fortes indícios de responsabilidade na prática de ato de improbidade que cause dano ao Erário (fumus boni iuris). 3. Tal medida não está condicionada à comprovação de que os réus estejam dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, tendo em vista que o periculum in mora está implícito no comando legal. Precedente do STJ. 4. Recurso Especial provido. (REsp 1115452/MA, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/04/2010, DJe 20/04/2010).
(...) 3. No especial, alega-se a existência de fundados indícios de dano ao erário - fumaça do bom direito - o que, por si só, seria suficiente para motivar o ato de constrição patrimonial, à vista do periculum in mora presumido no art. 7º da Lei n.º 8.429/92. 4. É desnecessária a prova do periculum in mora concreto, ou seja, de que os réus estariam dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, exigindo-se apenas a demonstração de fumus boni iuris, consistente em fundados indícios da prática de atos de improbidade. Precedentes. 5. O acórdão impugnado manifestou-se, explicitamente, sobre a plausibilidade da responsabilidade imputada aos recorridos, constatando, assim, a presença da fumaça do bom direito. 6. Recurso especial provido. (REsp 1203133/MT, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/10/2010, DJe 28/10/2010).
Sobre o tema, recentemente o Superior Tribunal de Justiça assim decidiu, verbis:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. LIMINAR. INDISPONIBILIDADE DE BENS. PERICULUM IN MORA PRESUMIDO.
1. Trata-se, originariamente, de Ação Civil Pública por ato de improbidade. Consta da narrativa da inicial e do Agravo de Instrumento que os ora agravantes "apropriaram-se ilicitamente de R$ 6.645.553,42 (seis milhões, seiscentos e quarenta e cinco mil, quinhentos e cinquenta e três reais e quarenta e dois centavos) repassados pela Sudam para serem aplicados no empreendimento Agroindústria Comércio de Peixes Tocantis S.A., localizado no Município de Porto Alegre, Estado do Tocantis, na implantação de um projeto de aquicultura, com implantação de um complexo empresarial, constituído de uma estrutura para produção de peixe em cativeiro, uma indústria para beneficiamento de pescado e uma fábrica de rações de peixe".
2. (...) 5. A concessão da medida de indisponibilidade não está condicionada à comprovação de que os réus estejam dilapidando seu patrimônio, ou na iminência de fazê-lo, tendo em vista que o periculum in mora está implícito no comando legal. Assim deve ser a interpretação da lei, porque a dilapidação é ato instantâneo que impede a atuação eficaz e acautelatória do Poder Judiciário. Precedentes: Edcl no REsp 1.211.986/MT, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 9/6/2011; REsp 1.244.028/RS, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 2/9/2011; Edcl no REsp 1.205.119/MT, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, Dje 8.2.2011; REsp 1.190.846/PI, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 10/2/2011; REsp 967.841/PA, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe 8/10/2010; REsp 1.203.133/MT, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 28/10/2010; REsp 1.199.329/MT, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, Dje 8.10.2010; REsp 1.177.290/MT, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe 1º/7/2010; REsp 1.177.128/MT, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, Dje 16.9.2010; REsp 1.135.548/PR, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 22/6/2010; REsp 1.134.638/MT, Relator Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, Dje 23.11.2009; REsp 1.098.824/SC, Rel. Ministra Eliana Calmon, Segunda Turma, DJe 4/8/2009.
6. (...) 7. Agravo Regimental não provido. (AgRg no REsp 1311465/TO, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 04/09/2012, DJe 24/09/2012).
Exige-se apenas a demonstração de fumus boni iuris, consistente em fundados indícios da prática de atos de improbidade, para decretação da indisponibilidade dos bens, requisito esse plenamente atendido no caso concreto, já que há nos autos elementos probatórios sugestivos da prática de improbidade administrativa, com delimitação precisa na inicial da participação de cada um dos requeridos.
Ante o exposto, nos termos do art. 7º° da Lei de Improbidade Administrativa, DECRETO A INDISPONBILIDADE dos bens dos requeridos, até o limite de R$ 5.476.650,43 (cinco milhões, quatrocentos e setenta e seis mil, seiscentos e cinquenta reais e quarenta e três centavos).
Proceda-se o bloqueio de valores depositados em contas bancárias de titularidade dos réus, via Bacenjud, assim como de valores depositados em planos de previdência privada complementar, limitado ao valor retromencionado.
Promova-se a pesquisa em nome dos réus pelo RENAJUD, com imposição de restrição.
Oficie-se aos Cartórios de Registro de Imóveis de Macapá/AP, Santana/AP e demais municípios, bem como de Belém/PA, para as devidas anotações de indisponibilidade dos bens eventualmente registrados em nome dos réus.
Na forma do artigo 17, § 7º, da Lei nº 8.429/92, após o cumprimento da liminar, DETERMINO a NOTIFICAÇÃO dos réus para, no prazo de 15 (quinze) dias, "oferecer manifestação por escrito, que poderá ser instruída com documentos e justificações".
Publique-se. Ciência ao Ministério Público do Estado do Amapá.
FONTE: http://www.tjap.jus.br/app/open/consultas/?task=pro
Processo nº 0044519-82.2012.8.03.0001 de 13/11/2012